Outra coisa que eu não gostava naquele cão era o tanto mimado que ele era. A namorada do meu pai aparecia lá no apartamento de vez em quando. Ela morava em Porto Alegre, mas fazia aparições estratégicas em São Paulo nos feriados e alguns finais de semana. O cachorro enlouquecia quando via a mulher: gemia, rolava no chão, pulava, corria em círculos. Ela fazia o mesmo antes de se levantar e me cumprimentar educadamente.
Mas o pior era quando ia embora. Tinha que conviver então com um cachorro em profunda depressão. Deitava no chão com cara de ressaca, levantava devagar, como se estivesse morrendo e ia mijar na varanda; com passos pesados, como se fosse o mais injustiçado dos animais; depois voltava pra sofrer calado na sua caminha.
Não é fácil conviver com um ser depressivo dentro de casa. Às vezes ia lá dar um chute nele e ver se estava vivo; o bicho só levantava a cabeça, me olhava e deitava de novo com olhar vazio dando um suspiro. Eu tinha vontade de dar cerveja, pinga, maconha, qualquer coisa pra ver se animava aquele animal. Mas se a namorada do meu pai soubesse que tinha dado qualquer coisa era capaz de me processar judicialmente. Além do mais, ela tinha essa mania estranha de colocar o cachorro perto da orelha e dizer: “me conta, diz se estão judiando de você minha linda, conta, conta tudo pra mamãe”. Claro que no fundo era só uma coisa boba, uma brincadeira, mas, mesmo assim, quando olhava pra cara daquele cachorro, tinha certeza que se pudesse falar o filho-da-mãe não hesitaria em discorrer por horas contra minha pessoa e entregar todos os meus podres.
Não sabia que a Lully ( assim se chama esse cão) tinha mexido tanto assim contigo, meu querido! Duas coisas: primeiro, deverias gostar mais dos animais ( para quem prega tantas coisas..), segundo, cachorro é ser fantástico, é fiel e não decepciona. Imagino que te faltou inspiração nesse dia, pena… sugiro escrever sobre o Lula, MST,etc. que é a tua praia, não é? Um abraço!
Ah, antes que eu esqueça, ela me fez estranhos relatos sobre tua pessoa…