Dizem que para atingir o nirvana a pessoa deve esvaziar a mente e chegar num estágio de libertação. Tentei uma vez fazer isso, mas só uma vez também… minha mente estava cheia demais de planejamentos pra tentar esvaziar assim, de repente. Talvez o plano principal era ir para Dubai. Tinha colocado isso na cabeça, de que iria para os emirados árabes e trabalharia como garçom em um hotel de luxo. Não que fosse entusiasta da idéia de Dubai, no fundo sabia que aquilo era uma grande loucura humana e que em breve desapareceria do mapa tão rápido quanto apareceu. Mas alguma coisa me dizia que eu tinha que estar lá pra ver!
Descobri um curso de árabe na rua Augusta, no Centro de Cultural Árabe Sírio. Era de graça, só pagava a matrícula, que, se não me engano, era uns 100 reais. Meu plano era estudar alguns meses, tentar arrumar um emprego lá nos Emirados e vazar rumo ao camarote de abertura do fim do mundo.
Árabe não é uma língua muito fácil. Ela é toda desenhada, com pontinhos e acentos que se misturam e formam linhas cardíacas impossíveis de decorar. A melodia também não era lá muito agradável; o que tornava o curso um investimento não muito seguro no quesito “cantar mulheres”. Mas mesmo assim eu estava animado, principalmente pela professora, Omaima. Todos os dias ela chegava meio tímida para uma turma de quase 60 alunos e começava a aula com um sotaquinho carregado; aquilo batina no meu ouvido como beijinhos carinhosos. Observava encantado cada gesto da jovem Síria de cabelos negros e olhos redondos e mal prestava atenção naquele bando de desenhos malucos que ela fazia na lousa.
Tinha me apaixonado por ela no momento exato em que a vi. Foi logo no primeiro dia de aula, quando no salão de conferências do Centro Cultural Árabe Sírio, um batalhão de mais de 300 alunos tomou o auditório para aguardar instruções sobre o início das aulas. Pode parece estranha a imagem de uma multidão aguardando o início de um curso de árabe, mas São Paulo é assim, eventos grátis costumam reunir multidões, seja um show no Ibirapuera, seja um curso de árabe na Augusta.
No microfone um sujeito de bigodinho que não falava português discorria sobre as vantagens de se falar árabe. “Arrala larrala Alarra larra, murrala”, arranhava o ouvido da galera. Ele era traduzido por uma senhora de óculos grossos. “Ele disse que o árabe é uma das línguas mais importantes do mundo”. No fim o sujeito terminou com alguma exaltação anti-americana e disse que seriam quatro classes coordenadas por dois professores. Foi aí que entrou um sujeito alto, de terno marrom, bigodinho e óculos redondo, mais parecido com um bibliotecário de Alexandria, que seria professor de uma das turmas.
Omaima, bela, misteriosa, elegante e com um perfume exótico das amêndoas do mediterrâneo entrou em seguida. A simples visão dela já era um intercâmbio cultural. Perdi-me naqueles olhos negros e imaginei cada experiência, cada história, cada sensação. Queria morar com ela o resto da vida à beira do mediterrâneo, em uma casinha de arquitetura Síria, com jardim florido e uma metralhadora para destruir os malditos yankees.
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